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Destaque do mês – Junho 2025

Este mês, trazemos um livro de leitura indispensável, escrito por Abdulrazak Gurnah (1948, Zanzibar, Tanzânia), Prémio Nobel da Literatura em 2021, autor de romances sobre o imperialismo/colonialismo, a escravatura, os refugiados, a perda, a função da memória no exercício literário. Refugiado, pediu asilo à Inglaterra em 1968, depois da Revolução de Zanzibar, em 1964, que perseguiu os árabes e os austro-asiáticos e depôs o governo de maioria árabe, substituindo-o por um de maioria africana. Tudo sobre o signo de um massacre de cerca de 20.000 cidadãos. Um ano antes, em 1963, o arquipélago de Zanzibar, situado na costa leste africana, conseguira a independência da Grã-Bretanha (uma colonização que teve início em 1890). Gurnah vive em Canterburry, onde foi professor na universidade de Kent.

            Sobre o mar (2001), escrito sobre um universo biográfico lactente, narra o reencontro de dois refugiados na Inglaterra, Saleh Omar e Latif Mahmud. Partindo duma narrativa ficcional sobre um negócio feito em Zanzibar, entre Saleh e o pai de Mamud, professor de Literatura Inglesa na Universidade de Londres, que entrega a própria casa para segurar um empréstimo a favor do sucesso esperado. O efeito boomerang perante da atitude de Latif Mamud perante o insucesso do negócio será dado a conhecer ao leitor durante o reencontro dos dois refugiados.

Muito mais do que a narrativa ficcional, o que a Gurnah nos traz é uma ficção-ensaio reveladora da História do mundo, desde o boom da industrialização, no século XIX, até aos nossos dias. É por isso que o imperialismo e o colonialismo, as duas guerras mundiais, o holocausto nazi, o racismo nos EUA, na Europa e em África , constituem o grande magma que viabiliza o desenvolvimento de uma história sempre junto ao mar, uma vez que , apesar  de Saleh ter deixado a ilha natal africana, centro marítimo, e de, na chegada à Inglaterra, ter vivido no campo de refugiados, acaba por viver, um regime bed and breakfast, numa cidade inglesa junto ao mar: «Vivo numa pequena cidade junto ao mar, como vivi toda a vida,…» (Gurnah, 2001: 10) Antes, porém de refugiar-se, podemos, através desta personagem, apercebermo-nos da brutalidade dos centros de detenção e do ódio aos emigrantes, durante a revolução de Zanzibar, no início da década de sessenta.

«Só passei umas semanas na prisão (…) Acontecia haver castigos, espancamentos e insultos (…). Espancamentos com mangueiras, tareias com bastões, ser obrigado a caminhar descalço sobre vidros partidos. (…) Os castigos eram aplicados no pátio por pessoas que atualmente ainda percorrem as ruas daquela cidade, tal como das suas vítimas. Durante o tempo que lá passei, só presenciei gritos e insultos, e flagelações com canas de bambu.» (Gurnah, 2001: 258-260)

Direitos de autor: ADA/BPAPDL

 

Disponível para empréstimo domiciliário

GURNAH, Abdulrazak – Junto ao mar. 1.ª ed. Lisboa: Cavalo de Ferro, 2022.
BPARPD EMP 82(678)-31 GUR/jun – PDE49568